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O livro Exu-Mulher e o Matriarcado Nagô, sobre masculinização, demonização e tensões de gênero na formação dos candomblés, lançado pela Editora Aruanda/Fundamentos do Axé, em 2023, durante a Festa Literária Internacional de Paraty, é fruto da tese de doutorado da Jornalista e Cientista da Religião, Claudia Alexandre. A pesquisa, realizada entre os anos 2017-2021, foi defendida e aprovada com louvor pela banca examinadora, no Programa de Ciência da Religião da PUC-SP. Já em 2022, foi reconhecida a Melhor Tese do Ano e indicada para o Prêmio Internacional Soter de Tese (Prêmio Afonso Maria Ligório Soares), destinado a reconhecer o trabalho de teólogos e/ou estudiosos e cientistas da religião, que conseguiram construir uma obra respeitada no Brasil e no exterior. A pesquisa foi finalista da premiação.

O Prêmio Jabuti reconhece a produção acadêmica em 29 categorias, sendo 27 no eixo Ciência e Cultura e duas de Divulgação Científica e Ilustração. Cerca de 1.900 inscrições foram recebidas nesta edição. Os cinco indicados ao prêmio de cada categoria foram escolhidos pelos critérios de relevância, inovação e potencial de impacto que podem causar na sociedade. A premiação está marcada para o próximo dia 6 de agosto, às 19, no Teatro Sérgio Cardoso. A cerimônia somente para convidados, autores e editoras será transmitida online pela Cãmara Brasileira do Livro.
Para a autora estar entre as cinco melhores obras acadêmicas do Prêmio Jabuti Acadêmico, o principal reconhecimento literário do Brasil, na categoria Ciência da Religião e Teologia, tem uma importância que amplia o significa da premiação, que que se refere a "revolução" no fazer cientifico e as transformações no meio literário. "Temos cada vez mais um olhar para a produção de corpos e criatividade de grupos que até pouco tempo estavam fora do lugar da academia. Apesar de ainda enfrentarmos o racismo estrutural no Brasil, temos um novo tempo no campo das relações étnico-raciais e isso é fruto de um lugar de produção de conhecimento mais diverso, inclusivo e menos hegemônico. Exu-Mulher tem esse significado também, o de propor uma nova narrativa sobre a formação das religiões afro-brasileiras, não só pela perspectiva de uma autora negra, com suas vivências, mas também propondo um debate sobre um matriarcado que permanece na estrutura da formação dos candomblés e com certeza, por meio de um orixá tão potente, ressignificar imáginários de forma a contribuir para a agenda contra a intolerância religiosa e o racismo religioso. Para mim chegar à final já é uma grande vitória", disse a autora.
A trajetória profissional de Claudia Alexandre, como comunicadora de rádio e TV, também é reconhecido pelo trabalho que realiza como especialista em sambas e escolas de samba de São Paulo. Ela é autora do livro Orixás no Terreiro Sagrado do Samba - Exu e Ogum no Candomblé da Vai-Vai (Editora Aruanda), fruto da dissertação de mestrado, também em Ciência da Religião pela PUC-SP, lançado em 2022. Um trabalho que segundo ela será "coroado" no próximo carnaval de 2025, pois o livro Exu-Mulher foi escolhido pelo carnavalesco Rodrigo Meiners para ser o enredo da Escola de Samba Pérola Negra, uma das agremiações mais tradicionais da folia paulistana. "Vai ter Exu-Mulher na Avenida, o que para mim é um dos reconhecimentos mais importantes, depois de quase 30 anos dedicados a este tema. Uma grande honra", comemorou.
O livro Exu-Mulher e o Matriarcado Nagô
A obra apresenta um debate inédito no campo dos estudos sobre as tradições e religiosidades afro-brasileiras em relação ao que foi escrito até aqui sobre o controverso orixá Exu. Ao mesmo tempo que insere registros e informações sobre as experiências e protagonismo de mulheres negras – africanas, escravizadas, alforriadas, libertas, que resistiram as opressões patriarcais para manter suas práticas ancestrais, a obra questiona sobre representações femininas de Exu que não foram inseridas na definição do corpo das tradições yorubá-nagô dos primeiros candomblés na Bahia. Com um detalhado levantamento, o livro destaca alterações na relação com o orixá Exu, que na iorubalândia (Nigéria, Benin, Togo...) é representado por figuras em pares – macho e fêmea, que não se popularizaram no Brasil.
Com prefácio assinado pela professora, escritora e ativista Dra. Núbia Regina Moreira, o livro é baseado na tese de doutorado da autora, defendida em novembro de 2021, eleita a Melhor Tese do Ano, pelo Programa de Ciência da Religião da PUC-SP. Foi finalista e segunda colocada do Prêmio SOTER/Paulinas de Teses (Prêmio Prof. Afonso Maria Ligório Soares) edição 2022, do Congresso Internacional da Soter (Sociedade de Teologia e Ciência da Religião). Mesmo ano em que lançou o livro-dissertação “Orixás no Terreiro Sagrado do Samba: Exu e Ogum no Candomblé da Vai-Vai”, também pela Editora Aruanda/Fundamentos de Axé.
O racismo religioso é centralizado como uma das opressões sociais e atravessa a ambiguidade do orixá Exu e reivindica o lado feminino do orixá, algo ainda pouco explorado na literatura sobre a formação dos candomblés de tradição yorubá-nagô, cujos terreiros que cultuam Exu-Legba- Legbara-Elegbara. Em algumas localidades da África Ocidental são bem conhecidas as representações de Exu como um orixá ambíguo, que pode se apresentar como feminino e masculino.
Uma busca motivada por registros de que em África, região da iorubalândia, alguns grupos realizam práticas rituais específicas onde figuras de Exu – masculina e feminina - evidenciam as diferenças anatômicas do par: ele com seu falo desproporcional, apito e gorro, e ela com seios e vulva demarcados e à mostra, jóias e, às vezes, acompanhada de outra figura que remete a uma criança. As imagens apresentam penteados alongados, uma marca da identidade do orixá. Em alguns lugares Exu é cultuado por famílias inteiras e por mulheres, onde está associado não apenas à fertilidade, como à fecundidade e à maternidade. Existem cultos exclusivos a essa divindade, onde se encontram representações femininas, nas regiões yorubá de Egbado, Igbomina, Ibraba, Olobo e Oshogbo.
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